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MARIA NA PALAVRA DE DEUS

MARIA NA PALAVRA DE DEUS
Pe. Aldo Fernandes
a) Maria prefigurada no Antigo Testamento
Com o mistério da Encarnação do Verbo, o Filho amado do Pai (cf. Jo 1,14), na plenitude do tempo (Gl 4,4), aquele que é a Palavra do Senhor, o Verbum Domini, tomou carne da carne de Maria, sangue do sangue de sua Mãe.
No DNA de Jesus estão os caracteres humanos de Maria, jovem de Nazaré, da Galiléia. Eis a notícia feliz, o Evangelho! O Anjo Gabriel foi enviado por Deus a Maria para lhe anunciar tamanha alegria! Não é por acaso que o nome Maria, em hebraico, significa “a amada”: foi assim que Deus a amou por primeiro, para que por meio dela manifestasse Seu grande amor por nós, comunicando Sua vida a cada ser humano que, por meio da Fé, abrisse as portas da vida e do mundo para acolher o Seu Cristo e seu Reino.
O anúncio desta feliz notícia tornou conhecido no mundo outro milagre: a Graça de Deus não somente havia enchido a vida de Maria; aliás, naquela jovem, a Graça Divina transbordava; por isso, disse-lhe o Anjo: “Ave, cheia de Graça, o Senhor está contigo!” (Lc 1,28). A partir dali, Maria se tornou a nova Arca da Aliança, o novo Templo, morada da Nova Lei, a nova Eva, a Mulher do Novo Testamento.

No alvorecer da Obra da Criação, o Senhor já vislumbrou no horizonte da Redenção a figura da Mulher, no Antigo Testamento – Eva, a mãe de todos os viventes, era prefiguração de toda mãe a vir a este mundo como matriz geradora da vida dos filhos de Deus; toda mulher-mãe se tornaria nos planos divinos co-criadora com Ele. Ele era o Pai Criador, e as mulheres se tornariam as mães, co-criadoras, colaboradoras na obra de criar um filho de Deus! Ela esmagará a cabeça do mal e vencerá sua força com a força do próprio calcanhar! (Gn 1,27-31; 2,8-25; 3,15-16; 3,20; 4,1-2).
No decurso da História da Salvação, o papel da mulher está todo ordenado à preparação da vinda do Filho de Deus. A Bíblia se dirige àquele maravilhoso evento da Encarnação e do Natal do Filho de Deus, nascido de uma mulher, de Maria. Na esteira de Maria, mulheres figuram na história que preparou a vinda do Filho de Deus, conforme se observa na genealogia de Jesus, relatada por Mateus 1,1-17.
A intenção de Mateus e de sua Comunidade é de demonstrar que Jesus não é um mito, uma crença vazia numa pessoa sem valor: Jesus é o Emanuel, o Deus conosco, o novo Moisés, é da descendência de Israel, filho de Davi.
Tal genealogia é possível somente fazendo comparecer ao longo dela nomes de mulheres que, apesar da má fama e atitudes que tiveram em suas vidas, até no que fizeram (no que se poderia julgar como um mal!) acabaram contribuindo para que o Filho de Deus fosse o Redentor do passado, do presente e do futuro, de todos os que estiveram no caminho histórico, do seu advento até as gerações posteriores à sua!

Mulheres como a prostituta Tamar (que se uniu sexualmente com Judá, seu sogro, para ter direitos de maternidade e primogenitura – Gn 38,6-30), Raab (prostituta pagã de Jericó, que por temor a Javé, acolheu e protegeu os espiões que Josué mandou a Jericó antes de invadir a cidade – Js 2,1-21; 6,22-25) e Betsabéia, a mulher do general Urias, do exército de Davi, que este seduziu e cometeu com ela adultério. Sabendo que ela tinha engravidado, ele planejou a morte do general Urias, colocando-o na linha de frente no combate, a fim de se livrar da responsabilidade da gravidez (2Sm 11; 1Rs 1,11-31; 2,13-25).
Outras mulheres prefiguraram Maria no Antigo Testamento: Rute, Ester, Judite e Ana. Sobre as três primeiras, a Bíblia dedica um livro com o nome de cada uma; quanto à história da última, está descrita no Primeiro Livro de Samuel.
b) As figuras do Antigo Testamento realizadas em Maria no Novo Testamento
O Novo Testamento é o lugar de Maria na História da Salvação: ela é a destinatária do alegre Anúncio da Encarnação da Palavra de Deus (Lc 1,26-35). Nela se cumpre toda a esperança do antigo Povo de Israel: nasceu dela o Messias, o Prometido de Javé.
Ela é a Cheia de Graça, porque o Senhor está com Ela, nela habita (Lc 1,28). Conceberá o Filho do Altíssimo (Lc 1,31-32). Ela é Virgem, não conhece homem algum (Lc 1,34). O menino que vai conceber será gerado nela por ação do Espírito Santo (Lc 1,35). O que ao homem é impossível, é possível a Deus (Lc 1,37). Como o Filho de Deus, Ela é serva: quer o que Deus quiser – que se cumpra nela a Vontade do Senhor (Lc 1,38).
O nome do Menino será “Jesus”, que significa Deus está salvando o seu povo de seus pecados; é “Emanuel”, que significa “Deus está conosco” (Mt 1,18-20). Na acolhida do Filho de Deus, Maria realiza o que o Senhor havia dito (Mt 1,22; cf. Is 7,14).
Maria é evangelizada: nela foi gerada a Palavra viva de Deus; Maria é evangelizadora: coloca-se a caminho para a casa da prima Isabel para anunciar as maravilhas que o Senhor nela realizou (Lc 1,39).
É proclamada “Bendita” entre todas as mulheres e “Mãe do meu Senhor” (Lc 1,42). É proclamada “feliz por ter acreditado”. É grande e obediente a sua Fé (Lc 1,45).
Intérprete das “magnalia Dei”, das grandes coisas que Deus fez nela por meio do Seu Filho (Ele é o Grande!), Maria empresta sua voz aos membros do seu Povo, aos Pobres de Javé (aos “anawin Yaweh”) para proclamar as Misericórdias do Senhor nela realizadas (Lc 1,46). Ela lê a história na ótica dos pobres e da ação amorosa e salvadora de Deus e diz que o Senhor olhou para a sua humildade (Lc 1,48).

No drama histórico da salvação da humanidade há uma verdade a ser proclamada: apesar de não ser nos nossos moldes e nos nossos tempos, Deus derruba do trono os poderosos e eleva os humildes, sacia de bens os famintos e despede os ricos com mãos vazias (Lc 1,51-54).
Maria é uma mulher sábia com consciência histórica lúcida. Ela sabe que foi assim que Deus havia prometido a Abraão: Ele prometeu e cumpriu. Ele é fiel (Lc 1,55)!
Por meio de Maria, um menino foi dado ao mundo. Este e todos os demais acontecimentos em torno deste Menino, Maria conservava no coração (= na memória) e meditava sobre eles (Lc 2,1-7 e 2,15-19).
Com José, Maria – mãe zelosa – vai apresentar sua criança ao Senhor no Templo (Lc 2,22). Ali, Maria e José encontram Simeão e Ana. Sobre eles paira o mesmo Espírito que paira sobre o Menino. Entre os justos jovens e os justos e piedosos anciãos (Lc 2,25), se encontra Jesus, o sinal de contradição, a causa da alegria de Simeão. Este menino vai revelar as intenções dos corações. Ele é a Verdade, que ilumina e liberta (Rm 8,32).
Jesus vai realizar o que Deus prometeu: vai derrubar os poderosos deste mundo e vai elevar os pobres e desesperados; para uns poucos, causa de queda; para muitos, causa de reerguimento. Ele será um sinal de contradição. Maria é a mãe, a fonte do Sinal de Contradição. Isso não ficará sem um preço a pagar: ela vai pagar com o Filho, vai participar do preço da reconciliação do mundo, vai pagar o título da dívida que havia entre a humanidade pecadora e Deus-amor (Jo 19,25-27).
Iluminada pelo mistério do Seu Filho, Maria é a primeira beneficiada pela Vida, Morte e Ressurreição de Jesus. Sendo primeira Discípula, Mãe e Mestra dos Discípulos amados, nos Atos dos Apóstolos encontramos Maria unida em oração com os Discípulos e as Discípulas, na espera de Pentecostes, quando o Espírito Defensor da Igreja (Parakleitós), prometido por Jesus, será enviado sobre todos numa manifestação (teofania) jamais vista antes (At 1,12-14).
Ela está unida na oração (liturgia), na comunhão (koinonia), no serviço (diakonia), na pregação (kerigma) e no testemunho dados por eles com o sacrifício da própria vida até o derramamento do sangue (martyria). Eis a razão pela qual todos proclamam Maria como Mãe da Igreja. Quem não se sente ligado a Maria, pode ser considerado desligado de Jesus, e sua salvação está carente do verdadeiro e único fundamento. Maria, então, é medianeira, intercessora, advogada, modelo e Mãe dos que foram salvos pelo Sangue de Cristo.
Nas cartas paulinas, encontramos uma referência fundamental para a Mariologia do Novo Testamento: Gálatas 4,4: “Na plenitude do tempo, Deus enviou ao mundo seu Filho, nascido de uma mulher”. Ela é a imagem do mundo amadurecido, da humanidade renovada na Graça, reconciliada com o Pai, pródiga na promoção da Vida, antecipação escatológica dos novos Céus e da Nova Terra.

O autor do Apocalipse se refere à Igreja, à Comunidade dos que entraram pelo Batismo no Caminho e na Comunidade formada pelos discípulos de Jesus, e com ele se tornaram também sinal de contradição. Se ele é o sinal de contradição, totalmente favorável aos que aderiram a Ele, Maria é o “grande sinal” que apareceu no céu e na terra: é a mulher vestida do sol. Ela é como a lua, que reflete a luz do seu filho, o sol do Oriente, o sol nascente que nos veio visitar. Ela tem a lua debaixo dos pés e na cabeça uma coroa de doze estrelas: foi feita Senhora do mundo, rainha e glória das 12 Tribos do seu Povo, Israel! (Ap 12,1).
Os Padres Apostólicos, intérpretes da Sagrada Escritura, identificaram Maria com a Igreja. Para São Justino, se Cristo é o Novo Adão, Maria é a Nova Eva, mãe dos novos viventes, dos que nasceram da água e do Espírito (Jo 3,5-6).
Santo Atanásio defendeu a seu lugar na Obra da Salvação da Humanidade e, ao defender a divindade de Jesus, acabou por contribuir para a proclamação dogmática da Maternidade Divina de Maria (sendo Cristo Deus de Deus, Maria é a Mãe de Deus – é a “Teotokos”).
São Bernardo de Claraval é o cantor da Virgindade de Maria e de sua grandeza no plano da salvação pela Encarnação do Verbo. São João Damasceno e São Germano de Constantinopla contribuíram com formulações fundamentais para o amadurecimento da verdade sobre a Assunção de Maria em corpo e alma ao Céu (dogma proclamado pelo Papa Pio XII em 1950).
E, como a História da Salvação não se encerrou com a última página da Bíblia ou do Evangelho, ao longo da história, Maria continua como Missionária junto à humanidade para evangelizar, convidar à oração e à conversão da vida toda, anunciar que o Reino do Céu é dos humildes e dos que se entregam na caridade, amando a Deus e aos irmãos e irmãs.
As aparições de Nossa Senhora em Lourdes, Fátima, Guadalupe, Aparecida, em Belém e em todos os lugares onde sua imagem é venerada, o Evangelho é proclamado, os Sacramentos são celebrados, milagres são relatados e o Povo de Deus é congregado na unidade da Trindade e na Esperança da Vida Eterna, em notória transformação da realidade marcada pelo pecado, a dor e a morte, mudados em santidade, saúde e vida feliz.
Isabel tinha razão quando dizia que Maria era bendita entre todas as mulheres (Lc 1,42). E Maria tinha razão quando predisse que todas as gerações a chamariam feliz em todo o mundo (Lc 1,48): as devoções marianas, as congregações que levam seu Nome, os Santos que se espelharam em Nossa Senhora, toda a riquíssima tradição litúrgica, teológica e artística que a Igreja possui sobre a Mãe de Jesus atestam muito bem que aquelas felizes profecias se realizam hoje na vida da Igreja!


Rogai por nós, Santa Mãe de Deus, para que sejamos dignos das promessas de Cristo. Amém.

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