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Novena Perpétua


A Novena perpétua à Nossa Senhora do Perpétuo Socorro

1.    Certamente, são muitas as conclusões que poderíamos tirar das reflexões que fizemos até agora. Consideremos apenas a Novena perpétua, que se tornou uma prática devocional internacional. Se de fato trazemos a preocupação de “anunciar o  Evangelho de modo sempre novo”, devemos superar qualquer tentação de repetição automática das celebrações, que é sempre mais cômoda. A nova Evangelização exige criatividade e audácia, além de uma “renovada esperança e corações renovados”. A Novena perpétua é um espaço de Evangelização, em que nossa principal colaboradora é Aquela que nós denominamos a Estrela da nova Evangelização. Como diz Papa Francisco: Há um estilo mariano na atividade evangelizadora da Igreja. Porque sempre que olhamos para Maria, voltamos a acreditar na força revolucionária da ternura e do afeto.” [1]


2.    Primeiramente, temos que estar sempre bem conscientes de que a Novena é essencialmente Piedade popular. Ela pertence ao povo e deve ser celebrada pelo povo. É um espaço onde o povo tem direito de manifestar suas alegrias, ansiedades e tristezas diante da Mãe. Tudo o que for ritualizado terá que respeitar o direito à emoção, à manifestação espontânea, à inserção dos fatos contemporâneos da vida humana. E é fundamental manter e salvar a consciência de que na Piedade popular cabe ao povo ser protagonista em todos os momentos. Por isso, é natural que a celebração da Novena seja animada por uma equipe de Leigos e até que determinados Leigos sejam preparados para exercer a presidência da celebração. O clero e nós, Redentoristas mais ainda, jamais deveríamos roubar ou limitar esse espaço de participação do povo, conquistado há séculos. O nosso papel é participar, animar e ajudar, evangelizando sempre.   

3.    O Ícone de Nossa Senhora deveria ser objeto de uma atenção particular em cada Novena, como ponto de convergência de toda a celebração. Através do adorno, da iluminação, da procissão, enfim, de algum modo deve-se chamar a atenção de todos para a contemplação do Ícone, como mensagem revelada que nunca se esgota e sempre se renova. Uma pequena oração contemplativa, à semelhança de algum verso do Akathistos, poderia tornar-se um refrão ou responsório, que convida ao louvor da Mãe de Deus e à contemplação do mistério que Ela nos apresenta em seu Ícone.

4.    O respeito à participação do povo se expressa nos textos da Novenas, que são diferentes segundo os lugares. É importante que seja elaborado de tal forma que a maior parte do texto seja recitado pela comunidade e não pelo celebrante e ajudantes. Por isso também, não deveria variar constantemente, uma vez que o povo se habitua às respostas e isso facilita a sua participação. Finalmente, a maior parte do texto da Novena deve ser oracional, isto é, um diálogo afetuoso de filhos com a  Mãe do Perpétuo Socorro, evitando demasiadas exortações, catequeses e conselhos.

5.    O Ícone nos conduz naturalmente ao anúncio da Palavra de Deus.  Trata-se de anunciar a Alegria do Evangelho. Insisto na leitura e na meditação dos 4 Evangelhos, enquanto proposta explícita de discipulado de Jesus e também porque são eles que nos revelam a realização plena da copiosa Redenção. E é dos Evangelhos, como expressão de fé em Jesus das primeiras comunidades, testemunhada até ao martírio, que deverá brotar uma nova convocação para o compromisso sócio-libertador, diretamente vinculado ao modo de ser e de agir de Jesus em relação a todos os “pequenos” do seu tempo.  Em cada Novena haja sempre um momento de evangelização através da homilia ou catequese. Em muitos lugares costuma-se ler simplesmente o Evangelho do dia, que nem sempre é adequado, pelo fato do Lecionário semanal do tempo comum ser uma leitura contínua de um dos Evangelistas. Por isso, seria melhor um roteiro catequético com leituras apropriadas a cada tema: por ex.: sobre os sete sacramentos, sobre as virtudes, sobre as parábolas do Reino, etc. ou seguindo uma catequese sistemática. Talvez nos tempos próprios como ciclo do Natal e ciclo pascal  poder-se-ia a seguir os Evangelhos propostos pela Liturgia da Palavra do dia.
6.    Outro aspecto fundamental da Novena são os gestos simbólicos como o beijo, o toque, a imposição das mãos, os recados escritos à Nossa Senhora, etc. Eles fazem parte da sacramentalidade popular, ou seja, do contato emocional do ser humano com o divino e do divino com o ser humano. Expressam afeto e respeito, e comunicam bênção e graça. Devemos valorizá-los e não apenas tolerá-los, integrando-os dentro do momento celebrativo.

7.    As Bênçãos da água, de quadros, imagens, medalhas e objetos deveriam aparecer como que um prolongamento  da Novena, enquanto levam para fora do ambiente de celebração algo daquilo de que se participou dentro da celebração. Eis porque se trata de um momento a ser melhor valorizado e a próprias fórmulas das bênçãos poderiam fazer referência a esse sentido de lembrança e de bênção que se leva para casa e se partilha com outras pessoas. 

8.    Quando a Novena perpétua se encerra com a Bênção do Santíssimo, seria muito bom que esse rito fosse percebido como o momento em que Maria nos entrega o seu maior presente, Jesus, nosso Redentor.  Ou seja, a Novena jamais deveria ser uma sequência de momentos paralelos, mas um encontro com Maria que nos conduz sempre ao seu Filho. Isso pode ser significado colocando o seu quadro próximo ao Santíssimo, para que se perceba que o Menino em seu braço é o mesmo Senhor presente na Hóstia consagrada.

9.    Finalmente, o fato de a Novena perpétua ser uma devoção internacional, seria o caso de pensar em algum sinal que crie uma identificação própria em todo o mundo, além das medalhas e outros objetos. Talvez, uma pequena oração à Mãe do Perpétuo Socorro que fosse conhecida e rezada em todas as comunidades? Ou também, uma aclamação cantada, como um pequeno refrão ou mantra, que fosse de gosto internacional e pudesse ser cantada em todas as comunidades? Além disso, sendo a Novena perpétua uma devoção divulgada principalmente por nós, Redentoristas, ela nos oferece um momento precioso em que deveríamos elevar sempre uma súplica à nossa Mãe querida pelas nossas Vocações, tanto em vista de novos candidatos como pela perseverança e fidelidade ao carisma missionário daqueles que já professaram.

1.      A Novena perpétua e a Liturgia

10.              A Comunhão dentro da Novena: A integração entre Piedade popular e Liturgia ainda é um caminho a ser iniciado em nosso rito romano. Por vezes ambas estão próximas uma da outra, mas de forma paralela, jamais integrada. Nossa Liturgia eucarística já chegou no passado a uma tal alienação da participação do povo, que não se permitia a comunhão dos fiéis para não atrapalhar a celebração. Eis o porque da comunhão fora da Missa, que normalmente era e é concedida aos enfermos e presos. No rito atual, o momento da Comunhão eucarística é sempre dentro da celebração eucarística, como um ato que se integra na comunhão fraterna da comunidade presente, na comunhão com a Palavra de Deus proclamada e na comunhão com Jesus Cristo ao renovar sua oferta sacrifical ao Pai durante a Oração eucarística. Por isso, o ideal seria chegar a uma integração completa entre Novena e Missa, criando uma celebração específica que una o Ícone, a Palavra de Deus e as Orações litúrgicas. Contudo, até que possamos chegar a este ponto, não se pode dizer que seja uma contradição tão grande dar a Comunhão durante a Novena. Contudo, seria muito bom se este momento se integrasse no ritmo da Novena através da elaboração de orações apropriadas que conduzam a ela. É como se fosse Maria quem, a partir da contemplação do seu Ícone, nos entrega sempre de novo o seu Filho como nosso Redentor, e essa é a graça maior que Ela pode nos dar.  

11.              A Novena combinada com a celebração da Missa: Em várias igrejas, a Novena  começa com cantos e orações dirigidas a Nossa Senhora, passa-se à Liturgia da Palavra com homilia, segue-se o rito da Missa até a Comunhão, e encerra-se com as bênçãos próprias da Novena, inclusive com uma Bênção do Santíssimo. Essa combinação entre Novena perpétua e Missa, mais do que uma integração, cria uma sequência de momentos paralelos, em que não se percebe facilmente um ponto de convergência. A primeira consideração é questionar o porquê dessa tentativa de combinação: seria uma exigência do povo e da sua piedade ou é uma proposta tipicamente clerical? Não há dúvida de que seria melhor se fosse evitada até que haja uma inculturação mais clara da Piedade popular na Liturgia ocidental. Contudo, como somos missionários populares, com certo carisma profético que nos impulsiona para além do legalmente estabelecido, e sonhando um futuro casamento entre Piedade popular e Liturgia romana, podemos nos permitir certa flexibilidade e criatividade, ainda que provoquem repulsa em certos liturgistas. Mesmo assim, seria desejável que criássemos, tanto nos ritos como nos textos, um mínimo de coerência, que expressasse uma integração e não apenas combinação.

12.              Neste sentido, a divina Liturgia de São João Crisóstomo poderia nos servir de inspiração, ensinando-nos a integrar o Ícone no todo da celebração. Em nossa sacramentologia, os níveis de presença real do Senhor se manifestam na Comunidade reunida, na Palavra proclamada e no Rito sacramental celebrado. Não seria o caso de resgatar também a tradição oriental, que une o Ícone à Palavra e lhe confere uma sacramentalidade enquanto sinal da presença do Senhor? Mas isso deveria nos fazer revisar toda a estrutura da celebração: a  entronização do Ícone, a sua colocação no espaço celebrativo, as referências dos textos e dos ritos deveriam assumir o Ícone em sua significação original, como celebração da copiosa Redenção representada por ele de forma tão explícita. É evidente que tudo isso exigiria um tempo apropriado, que não é possível encontrar em novenas que se seguem a cada meia-hora. É melhor uma Novena bem celebrada do que uma Liturgia apressada.

Conclusão

13.              As considerações que fizemos nos convidam a beber das duas fontes para evangelizar sempre, fazendo com que a Mãe do Perpétuo Socorro seja conhecida em todo o mundo, sempre como a Mãe do nosso Santíssimo Redentor. Herdamos um Ícone bizantino, que carrega em si mesmo uma mensagem específica da revelação cristã e se integra perfeitamente nas celebrações da divina Liturgia. Ele nos legitima e também nos desafia, porque traz em si muito mais do que já fizemos nesses 150 anos. E herdamos também uma devoção popular, principalmente a Novena Perpétua, que nos identifica totalmente com a tradição da Piedade popular do ocidente. Portanto, há um caminho a ser percorrido como meta de Evangelização, na qual uma das metas importantes será encurtar cada vez mais a distância entre Piedade popular e Liturgia. Como Piedade popular, deve continuar sendo uma devoção do povo e para o povo, como um espaço de direito, onde a vida humana pode se  manifestar em todos os seus momentos e dimensões.  Como Liturgia, o Ícone deve ser acolhido como um kérigma da copiosa Redenção, que o Senhor Ressuscitado continua oferecendo ao ser humano, através da mediação da sua e nossa Mãe Santíssima. E nossas celebrações deverão um dia ser o ponto de encontro entre Piedade popular e Liturgia, que, através da Mãe do Perpétuo Socorro, unifica a Vida de Jesus pelo povo com a vida do povo em Jesus.

14.              As palavras de João Paulo II de que a Igreja deve respirar com os dois pulmões, o ocidental e o oriental, formando um só corpo, devem nos provocar como missionários da Mãe do Perpétuo Socorro. Antes de mais nada, deve provocar em nós uma profunda alegria e agradecimento, porque, sem que nos rendêssemos conta, temos caminhado nessa direção ao obedecer o comando do Papa Pio IX: “Fazei-a conhecida em todo mundo!” Nenhuma outra representação de Nossa Senhora é tão internacional como o nosso Ícone, e acolhida de tal forma que cada comunidade dela se apropria como se fosse apenas sua. Temos ajudado a cumprir a predição de Maria Santíssima quando cantou: “Todas as gerações me chamarão bem-aventurada!” Ao mesmo tempo, nós Redentoristas assumimos como propriedade característica da nossa Congregação um Ícone da Igreja oriental. Certamente, Deus teve seus desígnios ao realizar este encontro maravilhoso, que não se esgota nesses 150 anos de história. Temos que continuar sendo profetas da copiosa Redenção, unindo a herança da nossa Piedade popular com a herança milenar da Igreja oriental. De um lado temos um povo sempre gritando por socorro, por redenção e libertação. Por outro lado temos um Ícone que representa a resposta a esse pedido e, pelas mãos de Maria, Mãe de Deus, oferece a todos a copiosa Redenção. Nos braços da Mãe do Perpétuo Socorro está a esperança já acontecida, que deve nos encher de entusiasmo missionário, e ser celebrada com profunda piedade na Novena, na Liturgia e em todas as formas possíveis.

“Mãe do Perpétuo Socorro, a teus pés deixa-me gozar a doçura inefável que brota desse abismo de amor que é teu olhar!”

Ø  Em relação à celebração da Novena, que aspectos já temos praticado e que aspectos ainda deveríamos  integrar? Que sugestões você daria para uma renovação da Novena Perpétua e das demais devoções a Nossa Senhora do Perpétuo Socorro? Como poderíamos manifestar a dimensão internacional dessa devoção? E como poderíamos integrar a herança oriental em nossa devoção?

Pe. J. Ulysses da Silva.CSsR.
Campo Grande, Brasil, maio de 2014




[1] Evangelii Gaudium, n. 288.

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